quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Prosas (de) vidas 2


Sentiu a raiva a crescer dentro de si, maldisse aquelas pernas curtas, que o faziam ficar para trás enquanto os outros desapareciam na curva do caminho estreito e pedregoso, que mais parecia traçado para cabras.

As lágrimas teimavam em molhar os olhos cor do céu, mas ele segurava-as bem dentro de si. Com os seus sete anos de vida, já tinha aprendido a chorar para dentro, a chorar como quem ri.

Continuou no seu passo certo, curto mas seguro ( pelo menos para quem o via), para ele nem tanto.

Ao chegar ao adro da igreja, sentiu as risadas dos colegas como punhais cravados nas costas, mas disfarçou, disfarçava sempre muito bem, tão bem que rapidamente desistiam de o provocar.

Mas desta vez foi mais forte do que ele, ao ouvir o Rato a dizer:

_Olha o Mariquinhas já chegou.

E pronto, as lágrimas caíram. Qual cascata impetuosa foram deslizando pela bochecha e nem a manga da camisola foi capaz de as deter.

Salvou-lhe a honra o amigo Zé, que qual cavaleiro andante, vinha sempre em seu socorro. Mais uma vez a vergasta de oliveira zumbiu junto às orelhas do Rato e este saltou, que nem um rato, e as pernas ficaram com um vinco avermelhado:

Ah, ah...não foste rápido a desviar-te...bem feito...aprende seu burro.

E o rato lá engoliu esta desfeita, mas lançou um ar de desafio ao Zé, como que a dizer:

_Não perdes pela demora.

O velho Fiat da professora apareceu na esquina, grandes e pequenos correram a bom correr desde o adro até à escola.

_Obrigado Zé, mais uma vez deste-lhe bem...já sabes que logo vais ter a bruxa à perna.

_ Vamos passar a correr, de ouvidos bem fechados...

_ Porra da velha, pensa que tem um santinho!

_ Pois que se meta comigo, ouve das boas.

_O pior é que ela vai fazer queixa ao teu pai, sabes como ele é, dá-te forte, e tudo por minha culpa.

_ Vá, anda daí, não sejas parvo.

E como dois irmãos, unidos por forte camaradagem, entraram para a sala.





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